Hoje, sonhei com uma abelha na janela do meu quarto, em meio à chuva forte e o frio congelante, a janela emperrada não me permitia salvá-la. Então, fiz força, bati contra o vidro que nem ao menos se movia. De fato, não fui capaz, naquele instante, de tirá-la de lá. Portanto, levantei-me às pressas da cama, me cobri com uma toalha, abri a porta do meu quarto e avancei pelo corredor, cheguei à sala, abri a porta e corri pelo lado esquerdo da casa. Tropecei em uma pedra e cai na poça de lama que se formava. Levantei-me, cheguei à janela.
Com leveza, cobri a abelha com as mãos, contra o vidro, tentava pegá-la, sem esmagá-la. Mas, não conseguia. Pressionei com força demais, ela se irritou. Naquele instante, senti que seria ferroado, a soltei imediatamente. Nesse entremeio, a chuva aumentava com rapidez. Pensei, então, em escoltá-la até um lugar seguro. Mas ela não entendia. Ou era eu que não a entendia. Afinal, o que ela queria? Por que não voou para um lugar seguro quando viu a chuva chegar?
Talvez a abelha precisasse correr o risco de enfrentar uma chuva tão forte. Ou talvez eu precisasse me sujar naquela poça de lama, talvez eu precisasse, afinal, levantar-me da cama e correr pela chuva. Enfim, talvez ela precisasse ser salva. Ou eu precisasse ser salvo. Não sei de onde ela veio até bater em minha janela, quantas chuvas enfrentou. Mas, quando ela me picou, acordamos ela e eu. A chuva já havia parado, o dia amanhecia, estávamos lado a lado.
Depois do café, em meio às conversas, devaneei por segundos. Lembrando do sonho da noite anterior, lembrei também como a conheci. Nos encontramos em um lago, mas, antes disso, já conversávamos por mensagens. Foi algo meio inesperado, com poucas palavras trocadas, até que, de repente, passamos a nos encontrar noite após noite, às claras. Nossas conversas quase sempre seguiam entre boatos, fatos e reticências. Em meio ao caos, tentávamos nos encontrar, não um ao outro, mas cada um a si mesmo.
Estávamos a mil quilômetros de distância, quatorze horas de viagem, dez pensamentos por segundo e zero reais no bolso. Amor em tempos de cólera, amor líquido como a água, que se mostrou sólido como rocha. Nem o tempo, nem a distância, nem o calor ou o frio congelante nos afetavam. Continuávamos lá, naquele espaço virtual. Às vezes, mesmo quando o sono tentava nos interromper, nós o vencíamos. Vencíamos o cansaço e a tristeza também. Sentíamos que poderíamos vencer qualquer coisa. Pois ambos tínhamos batalhas a enfrentar, todos os dias. Até hoje.
Um dia, ela me disse que voltaria. Esperei as quatorze horas e mais alguns dias. E quando a vi chegar, tudo em mim mudou. Eu já sabia que a amava. Eu já sabia que me casaria com ela. Aquele cheiro, aquele toque, aqueles cabelos longos e cacheados! Seus olhos brilhavam de timidez e os meus também. Às vezes, quem sabe, o amor à primeira vista seja mesmo real. Talvez seja, de fato, possível. Nós somos a prova. Acordei do devaneio, levando a xícara de café em direção à boca. Uma abelhava pousava. Naquele instante, percebi que já não chovia, o tempo se abriu. O café quente nos aqueceu, ela e eu.
4 Comentários
Um dia espero conseguir escrever tão bem quanto você. Que texto lindo professor !
Rafa, você é uma escritora maravilhosa, tenho orgulho de ser teu professor. Obrigado!
Texto lindo, Guilherme! 👏🏼👏🏼👏🏼👌🏼
Muito obrigado, amigo!😍